Keytruda, um medicamento de imunoterapia contra o câncer, está entre os medicamentos mais lucrativos já vendidos. Desde seu lançamento em 2014, arrecadou mais de US$ 130 bilhões (R$ 742,3 bi)em vendas para a Merck, sua fabricante americana, incluindo US$ 29melhor jogo do tigrinho,5 bilhões (R$ 168,4 bi) em 2024.
Mas, em setembro do ano passado, um medicamento experimental fez o que nenhum outro havia feito antes. Em testes de fase avançada para câncer de pulmão de células não pequenas, quase dobrou o tempo que os pacientes viveram sem o agravamento da doença —para 11,1 meses, em comparação com 5,8 meses para o Keytruda.
Os resultados foram impressionantes. Assim como a nacionalidade da empresa por trás deles. Akeso, uma empresa de biotecnologia, é chinesa.
Nos últimos meses, o progresso da China em IA (inteligência artificial) surpreendeu o mundo. Uma mudança mais silenciosa, mas igualmente significativa, está em andamento na biotecnologia. A China há muito é conhecida por produzir medicamentos genéricos, fornecer ingredientes brutos e gerenciar ensaios clínicos para o mundo farmacêutico.
Mas seus fabricantes de medicamentos agora também estão na vanguarda, produzindo medicamentos inovadores que são mais baratos do que os concorrentes. A China se tornou a segunda maior desenvolvedora de novos medicamentos, atrás apenas dos Estados Unidos.
Como consequência, as empresas farmacêuticas ocidentais estão cada vez mais olhando para o leste em busca de ideias. Devido ao vencimento de patentes de medicamentos, elas podem perder até US$ 140 bilhões (R$ 799,4 bi) por ano em vendas até o final da década.
No ano passado, quase um terço dos grandes acordos de licenciamento que fecharam —aqueles no valor de US$ 50 milhões (R$ 285,5 bi) ou mais— foram com empresas chinesas, o triplo da participação de 2020. A consultoria LEK estima que, durante esse período, o valor total dos medicamentos licenciados no Ocidente da China aumentou 15 vezes, para US$ 48 bilhões (R$ 274,1 bi). Em novembro, a Merck pagou US$ 588 milhões (R$ 3,3 bi) à LaNova Medicines, outra empresa de biotecnologia chinesa, para garantir os direitos de uma terapia semelhante à produzida pela Akeso.
O governo chinês identificou a biotecnologia como uma prioridade estratégica há quase duas décadas. Mas foi apenas em 2015 que as coisas realmente decolaram, após o regulador nacional de medicamentos lançar reformas ambiciosas. O órgão contratou mais funcionários e eliminou um acúmulo de 20 mil pedidos de medicamentos em apenas dois anos. Os ensaios clínicos foram simplificados e alinhados aos padrões globais.
Um estudo de Yimin Cui e colegas, da Universidade de Pequim, publicado na Nature Reviews Drug Discovery, descobriu que o tempo necessário para aprovar a primeira rodada de ensaios em humanos saiu de 501 para 87 dias depois das mudanças.
As reformas coincidiram com uma onda de retorno de "tartarugas marinhas", o termo para cientistas chineses que estudaram ou trabalharam no exterior. O vasto mercado doméstico da China ganhou impulso, atraindo todos os grandes fabricantes de medicamentos para suas costas, trazendo conhecimento e talento. Regras de listagem mais fáceis deram aos investidores em biotecnologia um caminho mais claro, tornando o setor mais atraente. O financiamento privado para biotecnologias chinesas aumentou de US$ 1 bilhão (R$ 5,7 bi) em 2016 para US$ 13,4 bilhões (R$ 76,5 bi) em 2021.
Com mais cérebros e dinheiro, as empresas chinesas foram além de copiar medicamentos ocidentais. Em vez de esperar que as patentes expirassem para fabricar genéricos idênticos, adotaram uma estratégia de "seguidor rápido" —pegando medicamentos conhecidos e modificando-os para melhorar a segurança, eficácia ou entrega.
O desenvolvimento de medicamentos normalmente começa identificando um alvo, geralmente uma proteína ou gene ligado a uma doença. Os cientistas então procuram moléculas que possam bloquear ou aumentar a função do alvo. Como os seguidores rápidos não estão começando do zero, eles podem realizar ensaios a uma fração do custo e da velocidade.
Entre 2021 e 2024, o número de medicamentos chineses em desenvolvimento dobrou, chegando a 4.391. Tratamentos do tipo seguidores rápidos e completamente originais compuseram quase 42% do montante.
Helen Chen, da LEK, observa que a abordagem da China tem sido particularmente eficaz em um tipo de medicamento contra o câncer chamado ADCs, no qual um anticorpo é ligado a uma carga de quimioterapia por meio de um conector químico. Como os componentes principais do tratamento já existem, o sucesso depende de combiná-los da maneira mais eficaz. Chen acredita que é nesse ponto que as empresas chinesas prosperam.
A velocidade é outra vantagem, diz Michelle Xia, fundadora da Akeso. "Podemos fazer as coisas duas ou até três vezes mais rápido do que em qualquer outro lugar do mundo", afirma. Os ensaios clínicos —a fase mais longa e cara do desenvolvimento de medicamentos— são mais rápidos do que no Ocidente. Uma grande população de pacientes facilita o recrutamento, e hospitais e médicos são incentivados pelo governo a apoiar a pesquisa.
Ensaios mais rápidos tornaram os medicamentos chineses ainda mais atraentes para farmacêuticas globais. Embora as informações clínicas sejam principalmente de pacientes chineses, em vez de uma amostra mais ampla, elas ajudam investidores e empresas a identificar tratamentos promissores.
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À medida que a qualidade dos dados da China melhorou, outros reguladores estão prestando atenção. Os resultados dos ensaios chineses da Akeso foram fortes o suficiente para convencer a Food and Drug Administration dos EUA a mover o medicamento diretamente para ensaios de fase avançada.
Poucas empresas chinesas vendem seus medicamentos diretamente nos EUA. Em vez disso, tendem a fechar acordos de licenciamento: uma empresa vende os direitos de comercializar seu medicamento fora da China em troca de um pagamento inicial, taxas baseadas em marcos e royalties sobre vendas futuras. O concorrente do Keytruda desenvolvido pela Akeso foi licenciado para a Summit Therapeutics, empresa americana de biotecnologia, por US$ 500 milhões (R$ 2,8 bi) adiantados, com até US$ 5 bilhões (R$ 28,5 bi) em pagamentos adicionais e uma parte dos royalties.
Outra abordagem é o modelo "NewCo", que envolve uma empresa farmacêutica chinesa desmembrando seus ativos clínicos em uma entidade americana separada, administrada por uma equipe de gestão local experiente. A empresa-mãe mantém a propriedade parcial, permitindo benefícios além dos royalties se o medicamento for bem-sucedido. O banco de investimentos Jefferies estima que cerca de oito dessas empresas foram formadas desde maio.
O boom da biotecnologia na China, no entanto, não está isento de riscos. O aumento nos acordos de licenciamento esconde uma crise de financiamento. O investimento privado em biotecnologia chinesa caiu para o nível mais baixo em sete anos em 2024, espelhando uma desaceleração nos mercados globais de biotecnologia. Os investidores estão priorizando empresas que geram caixa ou têm forte potencial internacional.
China, terra do meioJimmy Zhang, um investidor baseado em São Francisco, teme que muitos dos acordos de licenciamento de hoje sejam um produto do boom de financiamento passado. Sem novos investimentos, ele alerta, a fonte de medicamentos da China pode começar a secar.
Uma preocupação maior são as crescentes tensões com os EUA. Como os preços dos medicamentos na maior economia do mundo são menos controlados do que em casa, os pacientes americanos são uma grande fonte de receita para as empresas chinesas de biotecnologia.
As restrições comerciais americanas se aplicam a produtos de alta tecnologia; a biotecnologia chinesa até agora escapou de um escrutínio semelhante. Uma tentativa de bloquear empresas chinesas de fornecer alguns serviços e equipamentos de biotecnologia está parada no Congresso. Mas, com o comércio chinês na mira de Donald Trump, a biotecnologia pode não conseguir escapar ilesa por muito mais tempo.
A abordagem de vender para os EUA por meio de acordos de licenciamento pode oferecer proteção limitada; já as empresas chinesas de biotecnologia estão recebendo taxas de licenciamento mais baixas por seus medicamentos experimentais do que as americanas, devido aos riscos geopolíticos percebidos.
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Texto do The Economist, traduzido por Helena Schuster, publicado sob licença. O artigo original, em inglês, pode ser encontrado em www.economist.com
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